As mudanças na Lei da Nacionalidade levaram muitos brasileiros a anteciparem os pedidos de cidadania portuguesa.
Segundo advogados e assessorias de cidadania portuguesa, houve um aumento expressivo na procura nas últimas semanas, motivado pelo temor de que as novas regras tornem o processo mais demorado e burocrático.
O paulista Rafael Renato, consultor de vendas em Lisboa, decidiu agir rapidamente.
“Como a lei atual ainda me permite dar entrada, já fiz o meu pedido. Com a nova lei, o tempo vai alterar”, explicou ele.
Renato esperou dois anos e meio pela autorização de residência e completou outros dois anos e meio com o documento válido. Pela regra ainda vigente, esse período totaliza os cinco anos exigidos para solicitar a cidadania portuguesa.
A nova lei, entretanto, elimina o tempo de espera pela autorização e aumenta o requisito para sete anos de residência no país lusófono.
Escritórios registram aumento de até 70% na demanda
De acordo com a advogada Izabela Vasconcelos, da consultoria internacional Duplla Cidadania, o número de pedidos de cidadania por tempo de residência cresceu 40%.
“A maioria dos que estão correndo chegou entre 2018 e 2019 e tem tempo de espera acumulado na autorização de residência”, explicou. O escritório também registrou um aumento de 70% nos pedidos de cidadania de todos os tipos, incluindo processos por descendência e casamento.
Segundo Vasconcelos, muitos brasileiros estão buscando o documento para evitar problemas na AIMA, a Agência para a Integração, Migrações e Asilo, conhecida pelas longas filas e falhas no sistema.
“Se os processos de autorização e renovação fossem tranquilos, a cidadania não seria uma necessidade urgente”, destacou a advogada.
Mudanças na Lei da Nacionalidade
As novas regras da cidadania portuguesa, aprovadas em outubro pelo Parlamento, incluem as seguintes alterações:
- Aumento de cinco para sete anos do tempo mínimo exigido para brasileiros, cidadãos da CPLP e da União Europeia;
- Pedido só poderá ser feito após a expedição da autorização de residência, sem contar o período de espera no processo de imigração;
- Para demais nacionalidade, são necessários dez anos de residência em Portugal;
- Fim da concessão automática da cidadania a descendentes de judeus sefarditas;
- Possibilidade de revogação da cidadania portuguesa em caso de crimes graves;
- Extensão da nacionalidade originária, desde que comprovada ligação efetiva a Portugal;
- Filhos de imigrantes passam a necessitar de que um dos pais resida legalmente no país há cinco anos para ter direito automático à nacionalidade.
Brasileiros antecipam pedidos com ajuda jurídica
A capixaba Elisa Carla vive em Portugal desde 2020 e, ao completar cinco anos de residência, decidiu pedir a cidadania antes da mudança.
“Peguei empréstimo com uma amiga para dar entrada com assistência jurídica. Sozinha, não conseguiria em tempo hábil”, contou.
Ela gastou cerca de €850 entre taxas e honorários. Seu pedido foi baseado na data de expedição do visto de estudante, considerado um documento válido sob a legislação atual.
“O visto sempre foi reconhecido pelo regulamento da Lei da Nacionalidade”, reforçou Vasconcelos.
Advogados alertam para dúvidas e insegurança jurídica
O advogado Diego Bove, especializado em imigração, afirmou que a procura pelo seu escritório triplicou nas últimas semanas.
“Antes, tínhamos 10 a 15 pedidos mensais. Agora, são seis ou sete por semana”, relatou.
Já o também advogado Raphael Rocha, do Rio de Janeiro, destacou que a incerteza sobre o texto final da lei tem gerado preocupação entre os brasileiros residentes.
“Estamos adiantando os pedidos, não apenas por causa do aumento do tempo de residência, mas pela insegurança jurídica que as alterações trazem”, afirmou.
Efeito imediato na comunidade brasileira
As restrições devem impactar especialmente os brasileiros que aguardam regularização na AIMA ou que estão há menos de cinco anos em Portugal.
Muitos temem ficar “presos” em um limbo burocrático, sem poder formalizar a cidadania ou renovar a autorização de residência em tempo hábil.
O número de brasileiros residentes legais em Portugal ultrapassa 500 mil pessoas, segundo dados oficiais. Com a nova lei, a corrida pela cidadania portuguesa tornou-se um reflexo da tentativa de garantir estabilidade e segurança jurídica no país.