Na última terça-feira (25), o governo italiano oficializou, por meio da Gazzetta Ufficiale, um decreto que detalha como funcionará o acesso facilitado ao país para descendentes de italianos que vivem em regiões com grande presença de emigrantes. A medida coloca em prática parte central do chamado Decreto Tajani, aprovado em março e transformado em lei em maio de 2025.
A nova norma permite que cidadãos de sete países, todos com mais de 100 mil italianos registrados no AIRE, ingressem na Itália fora das cotas migratórias tradicionais, desde que sejam descendentes de italianos e possuam a cidadania local desses países.
Quem está na lista
A escolha dos países foi baseada no total de inscritos no AIRE em 31 de dezembro de 2024. Os números mostram:
- Argentina: 989.901 italianos
- Brasil: 682.300
- Estados Unidos: 241.056
- Austrália: 166.848
- Canadá: 148.251
- Venezuela: 116.396
- Uruguai: 115.658
Esses sete países concentram algumas das maiores comunidades italianas do mundo. A partir do decreto, descendentes com cidadania local poderão pedir permissão de residência por trabalho subordinado sem depender das limitações numéricas impostas pelo sistema de cotas.
No caso do Brasil, o impacto é expressivo. Se ainda estivesse submetido às cotas, haveria menos de 50 vagas para trabalhadores autônomos no período de quatro anos. Com a mudança, as autorizações para ítalo-brasileiros passam a ser ilimitadas quando se trata de empregos subordinados.
Caminho para a cidadania facilitada
O decreto também abre uma via simplificada para quem deseja obter a cidadania italiana por naturalização. Após dois anos de residência legal na Itália com permissão de trabalho subordinado, esses descendentes poderão apresentar pedido de naturalização, seguindo o rito especial previsto na nova legislação.
Críticas aos critérios
Para Daniel Taddone, conselheiro do CGIE – Conselho Geral dos Italianos no Exterior, a decisão não surpreende. “Era de se esperar porque isso já estava previsto no texto que saiu da conversão do decreto em lei”, afirma. Segundo ele, já havia indicação de que o governo definiria países com maior fluxo histórico de emigração italiana.
O conselheiro, contudo, questiona a lógica adotada na seleção. “Obviamente que isso demonstra, na minha opinião, uma interpretação errada da questão da cidadania, porque a cidadania é algo personalíssimo, não tem relação com o lugar para onde você imigrou”, critica.
Taddone também aponta arbitrariedade na escolha dos países: “O que faz de um descendente no Brasil de mais mérito do que um descendente que está no Paraguai ou na África do Sul? Não consigo ver.”
Quem ficou de fora
Apenas nações com mais de 100 mil italianos registrados no AIRE foram incluídas, critério que excluiu África do Sul, México, Peru e Chile. O CGIE chegou a sugerir que esses países fossem incorporados, mas a proposta não foi acolhida pelo governo.
O texto prevê que a lista poderá ser ampliada futuramente, caso novos decretos sejam emitidos.
Mudança de abordagem
A medida integra a estratégia do governo italiano de incentivar o “recupero delle radici italiane”, uma política voltada ao retorno às origens por parte dos descendentes, reforçada com a inclusão do artigo 1-bis no decreto-lei 36 de 2025 durante sua tramitação no Senado.
Além de estimular laços culturais e demográficos, a iniciativa busca aliviar o sistema judiciário, que enfrenta um volume crescente de ações de reconhecimento de cidadania iure sanguinis.
O decreto publicado leva a assinatura de Antonio Tajani, ministro das Relações Exteriores e Cooperação Internacional, além dos ministros do Interior e do Trabalho.