A cidadania italiana jus sanguinis voltou ao centro do debate jurídico após uma decisão relevante do Tribunal de Lecce, no sul da Itália.
Em sentença proferida no dia 15 de dezembro, a Justiça reconheceu o direito à cidadania italiana de descendentes residentes no Brasil, reforçando que atrasos consulares não podem impedir o exercício de um direito adquirido no nascimento.
A decisão acolheu o pedido patrocinado pelos advogados Rocco Barletta e Laura Antelmi, em favor de descendentes de um cidadão italiano que residia em San Michele Salentino, na província de Brindisi.
O tribunal destacou os princípios fundamentais que regem o reconhecimento da cidadania por descendência, devido ao momento delicado da cidadania italiana.
Direito é declaratório, não concessivo
Na sentença, o Tribunal de Lecce reiterou que o reconhecimento judicial da cidadania italiana jus sanguinis possui natureza meramente declaratória.
Isso significa que a decisão judicial não cria nem concede a cidadania, mas apenas reconhece um status jurídico já existente desde o nascimento do requerente.
Segundo o entendimento do tribunal, a cidadania italiana transmitida por sangue é um direito subjetivo pleno, adquirido automaticamente no momento do nascimento, desde que comprovada a linha de descendência e a continuidade da transmissão da nacionalidade.
Ônus da prova recai sobre o Estado
O tribunal também reafirmou um ponto central da jurisprudência italiana: cabe ao requerente apenas demonstrar a descendência de um ascendente cidadão italiano e a continuidade da transmissão da cidadania ao longo das gerações.
Por outro lado, compete à administração pública provar a existência de eventuais fatos impeditivos, interruptivos ou extintivos do direito alegado, como a renúncia expressa à cidadania ou a naturalização voluntária do ascendente antes do nascimento do descendente.
Esse entendimento foi reforçado com base em decisão recente da Corte Constitucional italiana, de 18 de julho de 2025, citada expressamente na sentença.
Atrasos consulares não suspendem direitos
Um dos pontos mais relevantes da decisão diz respeito aos longos atrasos enfrentados por descendentes de italianos nos consulados, especialmente na América Latina.
Em muitos casos, o tempo de espera para análise administrativa ultrapassa uma década. Um grande exemplo são os processos do Consulado Italiano de São Paulo.
Para o Tribunal de Lecce, esse cenário configura uma situação de incerteza jurídica incompatível com a efetividade da tutela de um direito fundamental.
Segundo a decisão, a demora excessiva justifica o recurso ao Judiciário, em conformidade com o artigo 2º da Lei nº 241/1990 e com o princípio da duração razoável do processo administrativo.
Carga de trabalho consular não pode limitar direitos
A sentença é clara ao afirmar que o elevado volume de pedidos nos consulados italianos não pode servir de justificativa para restringir ou postergar o exercício de um direito subjetivo perfeito, como é o caso da cidadania italiana por descendência.
“O acúmulo de trabalho nos escritórios consulares não pode impactar o exercício de um direito fundamental”, destacou o tribunal, reafirmando a prevalência do direito sobre a ineficiência administrativa.
Impacto para descendentes no exterior
A decisão do Tribunal de Lecce fortalece a posição de milhares de descendentes de italianos que aguardam há anos por respostas administrativas. O entendimento consolida a via judicial como alternativa legítima diante da morosidade consular, especialmente quando comprovados todos os requisitos legais.
Num mar de debates sobre possíveis mudanças na legislação da cidadania italiana, a sentença reforça a segurança jurídica de quem busca o reconhecimento da cidadania italiana jus sanguinis, deixando claro que direitos adquiridos não podem ser esvaziados por atos burocráticos.