Um brasileiro expulso de Portugal a cada três dias. Essa é a média registrada entre 2024 e 2025, segundo dados divulgados nesta semana pela Unidade Nacional de Estrangeiros e Fronteiras (UNEF), órgão policial responsável pelo controle migratório no país.
No período, 236 brasileiros foram expulsos do território português, mais da metade do total de 411 cidadãos estrangeiros extraditados.
Os números chamam atenção porque os brasileiros formam, de longe, a maior comunidade imigrante em Portugal. Ainda assim, lideram com folga a lista de nacionalidades alvo das expulsões, num contexto de crescente rigor nas políticas migratórias adotadas pelo governo português.
De acordo com Paulo Ornelas Flor, diretor da UNEF, os dados refletem uma atuação mais dura tanto nos controles de fronteira quanto nos processos administrativos de permanência irregular.
O endurecimento começa, muitas vezes, ainda no aeroporto de Lisboa, principal porta de entrada no país.
Casos no Aeroporto de Lisboa
Nos últimos meses, episódios envolvendo famílias brasileiras ganharam repercussão internacional.
Em agosto de 2024, uma mulher brasileira que vivia legalmente em Cascais há dois anos e meio foi impedida de reentrar em Portugal após férias no Brasil e deportada, sendo separada dos dois filhos, de 6 e 8 anos.
Em outubro do mesmo ano, outra mãe brasileira e seus dois filhos, de 1 e 7 anos, foram detidos por quatro dias no aeroporto de Lisboa antes de serem deportados para o Brasil.
O pai das crianças, que possuía visto de trabalho válido e emprego em Portugal, chegou a entrar no país, mas decidiu retornar ao Brasil semanas depois diante da separação familiar.
Esses episódios motivaram o governo brasileiro a intensificar o acompanhamento do tratamento dado aos seus cidadãos pelas autoridades portuguesas.
Em pelo menos um dos casos, o Consulado-Geral do Brasil em Lisboa ofereceu apoio jurídico, sem sucesso.
Mudanças na lei e apoio da extrema-direita
O aumento das expulsões ocorre em paralelo a uma série de alterações legislativas promovidas pelo governo de Luís Montenegro, com apoio do partido Chega, da direita populista radical.
A primeira fase do chamado pacote anti-imigração envolveu mudanças na Lei de Estrangeiros, aprovadas pelo Parlamento e sancionadas pelo presidente Marcelo Rebelo de Sousa, em vigor desde 23 de outubro de 2024.
As alterações afetaram especialmente os brasileiros, principal grupo de imigrantes no país. Na sequência, o governo avançou com restrições à Lei da Nacionalidade, ampliando o tempo necessário para que estrangeiros possam solicitar a cidadania portuguesa.
Essas mudanças estão sob análise do Tribunal Constitucional.
Um terceiro eixo do pacote ainda tramita no Parlamento e prevê regras mais céleres para a expulsão de imigrantes em situação irregular.
Brasileiros lideram notificações de abandono
Antes da expulsão propriamente dita, a legislação portuguesa prevê a emissão de uma “notificação de abandono”, que concede ao estrangeiro um prazo de 20 dias para deixar o país voluntariamente. Esse prazo pode ser contestado judicialmente.
Segundo a UNEF, em 2024, cerca de 90% das notificações de abandono emitidas tiveram como alvo cidadãos brasileiros. Já em 2025, até novembro, dos 386 avisos expedidos, 35% foram direcionados a brasileiros.
Diplomatas brasileiros ouvidos pela imprensa portuguesa afirmam que esses dados já foram oficialmente encaminhados ao Ministério das Relações Exteriores, em Brasília, que acompanha a evolução do cenário com preocupação.
Os números confirmam uma mudança estrutural na política migratória portuguesa, que passou de um modelo mais aberto para um sistema marcado por maior controle, fiscalização e expulsões, com impacto direto sobre a comunidade brasileira no país.